quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Império




"Ó Cesar,

Eis que quebrei meus castelos.
O que sobra são edificações trucidades, moles...
Porque eclode, ferve!"


Era uma terra vasta a beira rio, todos os habitantes eram caboclos magros sem dentes.Daquelas pessoas que se sente compaixão dócil, tão doce que dói. A terra era grande, população pouca, tão pouca que era o vazio espaço obrigatório entre os seres .Eram todos homens,toda fauna, toda flora eram masculinos espectadores. Não havia fêmea.
O expandir foi certeiro, os homens cresciam...Formavam edificações fortes e certeiras, eram caboclos de força espartana, ainda que de inteligência minguante, eram sábios estrategistas.Pouco a pouco foram ergendo os muros e tudo se converteu em cimento e cal, toda fé e toda glória almejada era aqui quatro paredes sólidas.

Um dos preceitos mais antigos para se justificar uma escravidão é a diferença.Digo porque grita no peito em que vivo,centenas de escravos pudores.A escravidão é totalitária, parte de um ponto cego e amplia-se. -Todo ser, é escravo do ser- Assim como o corpo é escravo do abstrato, assim como o pensamento é escravo da visão. O homem em si, é uma anglutinação de servo e senhor. Não há nada maior que o império existencial;e não é exatamente a ciência dos caboclos sobre o existencialismo que os levaram a essa segregação intensa e dolorosa, se deu simplesmente ao fato de que todos ali tinham uma casca puramente igual. Ombros largos, peito farto, e magreza forte daquelas que ofende.Não havia ovelha negra, não havia corpo em declínio, eram estátuas fortes em uma hegêmonia sobrenatural. Não havia inteligência a ser medida, eram homens brutos, de conhecimento bruto,eram como pedra que falava.Onde então encontrar a diferença vital para segregá-los em servos e senhor?

Devido a construção das paredes fartas, o império dos caboclos não expandiu. Nunca tiveram contato com fêmea alguma, nenhum caboclo nasceu, nenhum homem morreu. Só cresciam e envelheciam, ainda sem líder algum, sem guerra e sem paz. As edificações eram todas de uma mesma cor, de um mesmo tamanho, viviam sempre sozinhos, embora se juntassem para a caça em um horário rotineiro. A caça era silenciosa, de forma que ecoava um grito abafado do animal. Era um rugir denso, que ofuscava na pupila dos homens, o sangue jorrado entre as faces, entre as carnes e o barulho agudo dos dentes a molestá-la .A carne era comida crua, sem cerimônias, sem palavras.A face de quem comia era silenciosa e enigmática, como quando uma mulher goza de prazer em silêncio
Depois, abandonavam os ossos e andavam pesados para seus espaços, onde dormiam.
O caminhar era tão lento e doloroso, que os orgãos balançavam como se ouvissem música.Obervava aos poucos a genitália quieta, que acompanhava o homem farto, em seu único contato com os outros homens, igualmente fartos.
E foi nesse ritual bizarro, de prazer e morte, que pela primeira vez no império dos caboclos um homem chorou. Foi um choro gritante, daqueles de criança quando nasce. Para quem não conhecia as lágrimas foi o incentivo para que cuspissem dos olhos.Todos na metade do caminho das suas casas sentaram no chão, e calaram-se, como se estivessem pela primeira vez sentindo algo que fosse real. Um sentimento alcançável e palpável, que os aproximava do que chamamos de essência humana. Todas as lágrimas eram chuva em plantação moribunda e infértil. Eles, homens plantados ao solo, mostravam as primeiras raízes, que cresciam e se transformavam em um tipo de fúria efusiva. Eu, chamo do despertar das fêmeas no peito dos homens.

O choro durou aproximadamente um dia inteiro, não em lágrimas contínuas, umas até silenciosas e quentes nascendo no rosto parto e duro. O nascer ds lágrimas foi intenso e doloroso aos que conseguiam chorar, outros, porém, permaneceram estáticos e ainda mais duros e densos, INPENETRÁVEIS a qualquer sentir.

(Eis o subssídio da segregação)


No outro dia ninguém falou, mesmo que não houvesse uma comunicação direta e sensata, todos ali se entendiam, os olhos ainda vermelhos e vívidos, se converteram em transparencia melancólica -só quem chorou de mais pura dor em essência me compreenderá.-
Os que não derramaram as lágrimas não foram caçar nesse dia, muito menos nos dias vindouros.Amedontravam-se com a idéia de sentar ao solo e despencar, em vomitar todos os vazios, todas as dores secretas de cada ser.Os chorosos homens, eram de tudo menos covardia. O parto do primeiro imperador encontrara um divino berço, no meio de gritos selvagens e choro humano. Os espartanos caboclos chorando, e a edificação fria a espreita. O imperador foi o que não chorou, o que não se inflou de compaixão e alegria morta ao descobrir-se e vomitar-se. A característica de qualquer imperador vingente: negar que existe como existem os outros homens. Ele, pedra do próprio império.

Construiu sua própria casa, alimentou-se dos ossos da caça, viveu só, e com palavras falhas que se disseminaram como se espalha praga em plantação. Convenceu aos caboclos que as lágrimas era imitação medíocre das gotas da água do rio. ECLODIU
uns aceitaram calados, em uma submissão crente, como se aceitassem e cobrissem a própria vergonha, outros dominados pela fúria do absurdo gritavam, e então as lágrimas se converteram em grito, Gutural da caça.Gutural dos homens.
ECLODIRAM as revoluções. Ó CESAR, Ó DIVINO CÉSAR.

Eis o fim, que se aproximava doce, como doce sempre fora. O dia era de muita chuva, o que levou os homens a desistiram da caça, e caçarem uns aos outros. A matança foi bela, confesso. Enquanto se mostravam caboclos e fortes, e comiam a carne em barulhos agudos, sinceros! Era uma luta de pedregulhos andantes em defesa a própria fêmea, a própria crença que só existia em um mais profundo interior. A putrefação foi gigante que mal cabia a qualquer nariz. Dilaceraram-se. Como se fosse um holocauto sem judeus, sem negros, sem brancos. Todos ali eram igualmente pardos, iguais em casca, iguais em pele e corpo. Diferenciavam-se apenas na capacidade vil de chorar, choro muitas vezes morto, muitas vezes vazio. O choro que se chora, sem se saber.

Os que saíram vivos afogaram-se no rio.
César, morreu só na sua torre, colhendo as próprias lágrimas em frente a um jardim de chorosos homicidas.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

PS:





Só os olhos me falam.