sexta-feira, 19 de março de 2010
Latido de Adeus
Todo silêncio, são reticências cansadas da minha prece. Não sou muito mais do que me vejo. Não sou só esse cansaço, esse peito fraco, essas mãos frias que me ardem. Estou parada. Eu, e os fragmentos de mim. Não encontro a cronologia do que foi perdido. Abri os olhos, e fui pra fora de todas as sacadas procurando doçura no vento.Quero corromper comigo, estraçalhar todos os meus fardos, sair pra fora de todas as vidas, mover as janelas estáticas . Pulsa, porque sinto. e pulsa rápido, mais que os sonhos, mais que os olhos que piscam sem saber porque o fazem.
Escoam as lágrimas surdas.
E me molho em silêncio, sem pressa. Eis minha lavagem carnal, o limpar dos meus sujos, dos arrependimentos que se afirmam,hoje, como marcas inevitáveis, irrevogáveis. Estou na beira do leito da morte de um irmão.Banhando-me no fluxo do rio, nas margens de uma correnteza inescrupulosa, que me bate nas pernas. Com força. Sem compaixão. Ó morte, tu que és tão forte! Poupa-me. Conversa minha dor, não invada a minha força.
E vai levando a alma, aos poucos. Fazendo restar apenas lapsos desconexos de memória. Levou o afeto, o amor, as lembranças que ferem, que perdoam, que prometem... antes de transformar o corpo em cinza, em grão, em nada. Reconheço-me nos traços que ainda nos afirmam como semelhantes. O olhar firme. A claridade do azul que permeia o corpo, vomita a alma. Restam os semblantes desbotados do loiro, fixos sobre a magreza do dorso. Pele, osso, redenção.
Enoja-me a firmeza das palavras proferidas pelos homens.O choro que me invade os pulmões, contrói uma barragem sólida pra digestão dos carinhos. Todos os toques, os consolos, são alfinetadas medíocres sob pele morta. Todo meu invólucro sagrado, meu conjunto da derme, do escape, da máscara de sustento, se esvai. E cá estou, nua e inatingível. Em um mundo que desconhece as leis naturais alheias à morte. Não sou dual. Hoje, tenho nas duas faces, o rosto fúnebre . Sou os meus desconsolos, que foram guardados aqui, onde cheguei. A parte absconsa da alma que não se espera nunca encontrar. Venham sentimentos, machuquem-me. Não dói.
Anestesia moribunda do sofrer.
Seguro as patas do meu cão, e colo junto ao que me seriam patas se me fosse possível escolher a doçura do desumanizar. Se pudesse ser bicho... e ser selvagem entre árvores e esquecimentos.Encontro nos túneis ensopados de água, a possibilidade do sopro. Respiro. As peles que me foram arrancadas, começam a colar, a sanar. A beleza ofensiva de um quebra cabeça metafísico, onde não existem peças, nem lógicas, nem razão. E se há a possibilidade de vida. Vivo, meesmo que diminuída. As partes que me foram só ternura, estão enterradas na minha memória e no túmulo em que meus cães foram comidos por outros bichos, invadidos por vermes. Viraram adubo. Florescem.
Agora, apenas seco ao sol,
Eis meu latido de Adeus.
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Um comentário:
muito bom seu blog! :)
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